quarta-feira, 28 de abril de 2010

É Deus, parece que vai ser nós dois até o final.

Queria que tivesse sido ao contrário, que seu corpo fosse completamente meu, assim como a sanidade e os pensamentos incontroláveis. Queria sua entrega nos absurdos do abismo, onde tantas vezes me joguei sem você nem perceber, talvez porque estivesse olhando demais para o outro lado. Gostaria tanto que desse em troca, sem ter que pedir, humilhar, abrir mão do que eu era pra ser (e estar) você. Mas parece não ter acreditado quando te disse que a minha felicidade era a sua. Nos desgastamos demais. Eu me desgastei demais, não esqueço. Mas não me arrependi também, afinal, amor não faz mal algum. Altas dosagens é que o torna veneno. E esse veneno é tão imune as ervas daninhas, bicho papão, medo, coisas que tendem a nos matar... só você não era imune a ele. Só você não quis o que era pra ser seu, empurrou para terceiros o que não poderia comportar, via tudo isso, ainda assim, não desistia. Não desistia porque sabia que valia pena. E teria realmente valido se em meio ao que você era, tivesse me descoberto, justamente assim: tão frágil, tão boba e tão perdida. Seus olhos eram limitados, sua mente ocupada demais, seus braços grandes demais pra alcançar o mundo, mas pequenos quando se diz respeito a um abraço... Pelas mortes das pequenas importâncias, eu não estou mais onde você pisa. Estou onde você me vê, através de uma parede invisivel protetora que me mantém longe o bastante de algo que indica perigo. Perigo de você ver que sou composta de urgências. De você. Principalmente.




"Minha lâmpada de cabeceira está estragada. Não sei o que é, não entendo dessas coisas. Ela acende e, sem a gente esperar, apaga. Depois acende de novo, para em seguida tornar a apagar. Me sinto igual a ela: também só acendo de vez em quando, sem ninguém esperar, sem motivo aparente. Para a lâmpada pode-se chamar um eletricista. Ele dará um jeito, mexerá nos fios e em breve ela voltará a ser normal, previsível. Mas e eu? Quem desvendará meu interior para consertar meus defeitos?"

(Caio Fernando Abreu)

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